segunda-feira, junho 30, 2008

Previsões para as presidenciais americanas

O último número do International Journal of Forecasting é uma delícia para viciados nas eleições americanas. Vários artigos discutem o desempenho passado de modelos de previsão dos resultados das eleições, das sondagens e dos mercados electrónicos.

Em 2004, o primeiro modelo a ser divulgado, logo em Janeiro, foi o de Helmut Norpoth. Foi o primeiro modelo porque se baseia em variáveis que podem ser medidas relativamente cedo: os resultados das primárias em New Hampshire, os resultados das duas últimas eleições presidenciais e uma variável medindo identificação partidária (baseada nos resultados das eleições para o Congresso). Aplicado a todas as eleições desde 1912, o modelo prevê correctamente o vencedor em todas as eleições menos uma (1960). Para 2004, previa que Bush iria derrotar Kerry por 54,7% contra 45,3%. Na verdade, o resultado foi 50,7% contra 48,3%. Mas o modelo bateu, de longe, como instrumento de previsão, quer as sondagens quer as cotações dos mercados electrónicos da mesma altura, ou seja, Janeiro de 2004. E o que diz o modelo desta vez para Obama-McCain em 2008? 50,1% contra 49,9%. Um dos problemas disto, claro, está aqui:


O modelo de Douglas Hibbs tem duas variáveis principais:

(1) weighted-average growth of per capita real personal disposable income over the term, and (2) cumulative US military fatalities owing to unprovoked, hostile deployments of American armed forces in foreign conflicts.

Em 2004, previu correctamente a vitória de Bush, errando por apenas 1,8%. A previsão para 2008:

Those political-economic fundamentals imply an expected Republican two-party vote share centered on 48.2%. Barring unforeseen political shocks favoring the Republican candidate (presumptively John McCain), the Democratic standard bearer (presumptively Barack Obama) ought to win the 2008 presidential election by a margin in the neighborhood of 3.6 percentage points.

Ray Fair, com um modelo que inclui crescimento, inflação e nº de períodos trimestrais com crescimento económico elevado prevê 47,8% para os Republicanos. A página deixa-nos brincar com os valores das variáveis independentes e obter novas previsões.

Estes modelos costumam ter versões finais em Julho/Agosto, dado que utilizam dados da economia ou da popularidade do incumbent que só nesta altura estão disponíveis. Mas neste último número do IJF - com artigos escritos entre Julho e Novembro de 2007 - há já outras "previsões condicionais", baseadas em valores hipotéticos dos dados da popularidade e do crescimento. Alan Abramovitz prevê que uma vitória do Partido Republicano é impossível com os actuais valores da popularidade de Bush. Ela só começaria a tornar-se possível com um saldo de popularidade acima dos 10% em Junho de 2008. Neste momento, existe um saldo negativo com valores entre os -30 e os -50%. Michael Lewis-Beck e Charles Tien prevêm, condicionalmente, uma votação para o Partido Republicano entre 41.4 e 48.5%, dependendo de utilização de crescimento económico ou criação de empregos como variáveis independentes.

E depois há, claro, algo completamente diferente: The Keys to the White House, por Alan Lichtman, um historiador da American University. O método de Lichtman é um índice, de natureza qualitativa, que usa simplesmente respostas "sim"/"não" a 13 perguntas básicas. Quanto mais respostas "sim", maior a probabilidade de que o partido no poder renove a vitória. O método prevê correctamente o resultado de todas as eleições desde 1860 (mas ver aqui como a frase anterior não faz muito sentido). Eis as "chaves":


Destas perguntas, Lichtman respondia negativamente, em Novembro de 2007, a oito delas (e com Obama talvez tenha de responder a nove, ou seja, à última). Resposta: Democratas ganham. E como isto é convertível num modelo de previsão de percentagem de voto - nº de keys como variável independente do voto no incumbent - Lichtman prevê 46% para os Republicanos.

A última coisa a tomar em consideração, neste momento, é que, em 2004, a partir de Maio, os valores do Iowa Prediction Market estabilizou numa percentagem para Bush que, comparada com o que se veio a verificar em Novembro, exibia um desvio sempre igual ou inferior a um ponto percentual. E qual tem sido o valor para vote shares?


Em suma: ninguém, com excepção de Norpoth em Janeiro passado, prevê outra coisa que não uma vitória dos Democratas nesta eleição. Vou actualizando isto com as novas previsões à medida que forem saindo.

sexta-feira, junho 27, 2008

Novo ciclo

Com a última sondagem da Marktest, ficamos com uma primeira aproximação à avaliação que os portugueses fazem da actuação de Manuela Ferreira Leite. 43% não acham coisa alguma, o que não lhes fica mal, tendo em conta que, sensu stricto, não há nada para avaliar. Mas outros recorrem às suas predisposições ideológicas e partidárias, à imagem que dela formaram no passado recente ou distante ou até, quem sabe, à comparação com Sócrates, para chegar a uma conclusão. A conclusão a que a maioria desses chega é negativa, mas menos negativa que em relação a Menezes no período anterior ou Sócrates no momento actual. Mas tudo pode mudar à medida que mais opiniões se forem cristalizando. Para a Menezes, a mudança posterior foi para pior. Em relação a MFL, quem sabe?*

O gráfico que se segue (cliquem nele que verão melhor) é apenas para os dados da Marktest. Usa-se um saldo de % de avaliações positivas - % avaliações negativas, ponderado pelas não respostas. As linhas verticais marcam as últimas sondagens realizadas antes de momentos relevantes: eleição de Cavaco Silva; caso Independente; eleição de Menezes; eleição de Ferreira Leite.



*Ou para usar a terminologia de uma abordagem que aprendi há pouco tempo (olá LA-C): trará a eleição de MFL uma mudança de estrutura à serie de popularidade do líder do PSD, tal como aquela que, aparentemente, ocorre no caso de Sócrates após o caso Independente?

quarta-feira, junho 25, 2008

"Mobilização assimétrica", julgo ser o termo


Ainda a Irlanda

Poucas pessoas sabem tanto sobre o comportamento eleitoral na Irlanda (e não só) como Michael Marsh. Vale a pena ler este artigo no Sunday Post sobre o referendo: What did the voters mean when they said No to the Lisbon Treaty? Nem tudo o que lá é dito confere exactamente com o que defendi aqui, pelo que é ainda mais interessante, pelo menos para mim. Algumas passagens:

In this referendum campaign, although five out of six Irish parties, with a combined support of 85 per cent at the last national elections, supported the treaty, only 9 per cent of voters were contacted in person by the Yes side. The No side reached 8 per cent. A small group was contacted by both sides (3 per cent), but 86 per cent were not contacted at all. It seems difficult to maintain that the government or the other parties on the Yes side went all out to secure a victory. Moreover, it is indeed remarkable that the No side, lacking the established infrastructure of party organisations, reached about the same number of voters as the Yes side.

We asked whether Lisbon would have compromised Ireland’s neutrality; made the practice of abortion more likely in Ireland; led to a change in tax on businesses; reduced Ireland’s influence on EU decisions; strengthened the protection of workers’ rights; caused even more unemployment; lost us our European Commissioner for some of the time; and finally, simplified decision-making in the EU. The results indicate that the No arguments seemed to have won the campaign. Substantial majorities agree with their interpretation over the interpretation of the Yes side. Even on abortion, where their arguments were rejected by the Electoral Commission, a significant minority (39 per cent) was concerned that abortion could be brought closer had Ireland voted Yes.

Those most uncertain about their economic future, due to perceived decline in their own living standards in the last year, also tended to vote No. These factors are outside anyone’s immediate capacity to address, although dissatisfaction with the government - equally high at the time of Nice II - is not necessarily associated with a rejection of an EU treaty, at least to the degree it is associated here. Nor is it the case that voters were simply rejecting Europe. Over 40 per cent of No voters supported even more integration over protecting our independence from the EU.

E um gráfico espantoso, que mostra - aqui sim de acordo com o meu argumento - que o problema não foi a abstenção: aqueles que não votaram eram ainda mais hostis ao Tratado. Mais informação sobre a sondagem pós-eleitoral aqui.

terça-feira, junho 17, 2008

E já agora, este senhor para running mate.

"I'm not particularly interested in having a picture of me and George W. Bush on my wall" (a história completa contada aqui).

E agora, para o que realmente interessa


Para ficar tudo clarinho, neste blogue, por muito que se tente, não se consegue ser imparcial em relação ao resultado final. Independentemente de simpatias ou antipatias pessoais com os candidatos, quer-se tudo azul.

Mas na Polónia, ainda assim, sim

Survey: Poles support EU's reform treaty
Poles would back the European Union's Lisbon Treaty by a wide margin if it were put to a referendum, a newspaper reported Monday. A poll of 1,000 adults found 71 per cent of Poles said they would vote for the reform treaty, which Irish voters rejected in a referendum last week, the Dziennik daily said.

Na Holanda, também não

Poll: Dutch Would Also Reject EU Treaty

A majority of the Dutch is against the Treaty of Lisbon, according to a poll by Maurice de Hond. But the Netherlands is going ahead with its ratification. If the Netherlands were to hold a referendum now on the new EU treaty, 54 percent would vote against it, De Hond reported. He polled the views of the Dutch after the Irish rejected the treaty last week. A majority (56 percent) wants the Netherlands to also hold a referendum on the Treaty of Lisbon. It is an adaptation of the European Constitution, on which a referendum was held in the Netherlands in 2005 - which rejected it by 62 to 38 percent. (...) But there will be no referendum. The Netherlands is going ahead with the ratification of the Treaty of Lisbon, even though the Irish have rejected it, said Premier Jan Peter Balkenende.

segunda-feira, junho 16, 2008

Leitura útil por estes dias

Second-order’ versus ‘Issue-voting’ Effects in EU Referendums

Are referendums on EU treaties decided by voters’ attitudes to Europe (the ‘issue-voting’ explanation) or by voters’ attitudes to their national political parties and incumbent national government (the ‘second-order election model’ explanation)? In one scenario, these referendums will approximate to deliberative processes that will be decided by people’s views of the merits of European integration. In the other scenario, they will be plebiscites on the performance of national governments. We test the two competing explanations of the determinants of voting in EU referendums using evidence from the two Irish referendums on the Nice Treaty. We find that the issue-voting model outperforms the second-order model in both referendums. However, we also find that issue-voting was particularly important in the more salient and more intense second referendum. Most strikingly, attitudes to EU enlargement were much stronger predictors of vote at Nice 2 than at Nice 1. This finding about the rise in importance of attitudes to the EU points to the importance of campaigning in EU referendums.

sexta-feira, junho 06, 2008

Adenda

Há uns tempos, escrevi uma coisa sobre os "valores de esquerda" da actual Câmara de Lisboa. Junto adenda:

"A apresentação de um novo modelo da marca de automóveis Skoda arrancou ontem à tarde na Praça das Flores, sob os protestos dos comerciantes e moradores da zona. Em causa está o facto de a Câmara de Lisboa ter autorizado que a organização vedasse o local durante os 17 dias do evento, (...) a troco de 150 mil euros e da reabilitação do jardim central. (...) 'Ia a passar pelo meio do jardim, quando os seguranças apareceram e me barraram a passagem'"

Referendo Irlanda:

A sondagem mais recente, divulgada hoje, é da TNS, e é a primeira que dá vantagem ao Não.

Irish Times /TNS mrbi poll:


Isto contrasta, apesar de tudo, com as sondagens da Red C que tenho divulgado aqui. Aqui, chama-se a atenção para a diferença na formulação das perguntas. E toda a campanha fala em "Lisbon Treaty", em vez de "Reform Treaty"...

Uma coisa é certa: quando mais tempo dura a campanha, menos indecisos e mais "nãos".

quinta-feira, junho 05, 2008

Altruistic (sort of) plug

Eu se fosse a vocês não perdia isto:

Pedro Lains: Lectures on the History of European Integration

Sobre o voto económico

No seguimento do que escrevi 2ª feira passada, duas notas:

1. Num artigo muito recente, Pedro Adão Silva menciona que "há uma hipótese da sociologia eleitoral que tem revelado assinalável potencial explicativo e que nos diz que os eleitores sabem distinguir os partidos em função das suas prioridades e que, em períodos de maior desemprego e crise social, votarão mais à esquerda e em períodos de maior inflação e dificuldades financeiras, votarão mais à direita."

Aquilo a que o Pedro se refere é ao chamado "voto económico prospectivo". Ao contrário do que sucederia com o "voto económico retrospectivo" - em que os partidos de governo, e eventualmente mais os de esquerda - seriam prejudicados pelo desemprego, no "voto económico prospectivo" a hipótese é que os partidos de esquerda poderiam ser beneficiados pelo desemprego, sugerindo que os eleitores votam a pensar na forma como situações actuais podem ser resolvidas por políticas futuras.

Um dos aspectos mais interessantes deste livro tem precisamente a ver com este assunto e com alguma clarificação que é trazida a este respeito: o que eles concluem é que os efeitos do desemprego são diferentes consoantes a dimensão dos partidos de esquerda. "Grandes" partidos de esquerda no governo são castigados pelo desemprego. Partidos de esquerda "pequenos" são beneficiados pelo desemprego. Não sei se era bem nisto que o Pedro estava a pensar...

2. Ninguém percebeu ainda muito bem as "micro-fundações" do mecanismo através do qual os eleitores castigam os governos pelo mau desempenho da economia. Uma das conclusões que - pelo menos a mim - geram mais perplexidade é o facto de, quando usamos inquéritos, as avaliações que os inquiridos fazem da situação económica do país ter consequências muito maiores no voto que a avaliação da situação económica pessoal. Há quem diga que isto sinaliza "altruísmo"e grande responsabilidade dos eleitores, mas acho que há para aqui muita endogeneidade (a avaliação da situação económica é muito explicada por simpatias partidárias, e há muita racionalização das respostas nos inquéritos, mas enfim).

Seja como for, se for mesmo verdade que os eleitores retiram muita da informação sobre a economia dos media, então o que há a esperar até 2009 é um combate ferocíssimo sobre a interpretação dos números. Aqui vai haver imenso trabalho e espero que detectem as contabilidades criativas de ambos os lados. E vai valer muito a pena reler este clássico.

quarta-feira, junho 04, 2008

Boas companhias

Um guitarrista: Jerry Garcia (um machado quando tinha 4 anos).

Dois presidentes: Lula da Silva (precisamente o mindinho da mão esquerda) e Boris Yeltsin (dois, aparentemente a brincar com uma granada).

Dois actores do cinema mudo:Buster Keaton e Harold Lloyd.

The famous outlaw Jesse James.

Claus von Stauffenberg.

E Galileo Galilei (post mortem, ao que parece).

Never trust a pollster


É todo vosso. Já me disseram que se pode fazer uma vida quase normal.

segunda-feira, junho 02, 2008