terça-feira, fevereiro 23, 2010

PORDATA

Sou algo suspeito, porque faço parte do Conselho Científico da Fundação Francisco Manuel dos Santos. Mas dificilmente se poderia imaginar uma primeira iniciativa da FFMS mais auspiciosa do que a PORDATA.

Primeiro, porque a PORDATA congrega num único suporte um conjunto de dados estatísticos sobre a sociedade e a economia portuguesas que se encontravam dispersos por muitas fontes oficiais, tornando essa informação mais acessível e transparente. Segundo, porque a própria construção da PORDATA levou, no contacto com essas fontes, à detecção de lacunas e problemas nessa mesma informação. Neste sentido, a PORDATA já contribuiu não apenas para a disseminação de informação mas também para a melhoria da sua qualidade. Terceiro, porque uma das coisas em que se teve maior cuidado na construção desta base foi na análise das mudanças de critérios na medição das variáveis, permitindo a quem analisa os dados perceber em que casos as evoluções ao longo do tempo reflectem alterações reais ou, pelo contrário, simples mudanças de critérios. Sabendo como pensam os governos e como este tipo de dados se presta à manipulação, isto não é coisa de somenos. E quarto, porque estes dados são disponibilizados pela PORDATA de uma maneira mais amigável, manejável e atraente do que em qualquer fonte oficial portuguesa que conheça. É evidente que o seu uso ainda exige um conjunto de competências mínimas. Mas o facto de o suporte de tratamento de informação ter sido criado de raiz permite que seja mais friendly que os sites e suportes das fontes oficiais, facilitando o seu uso não apenas por especialistas mas também por jornalistas, estudantes e público interessado em geral.

E há um último ponto, para mim não menos relevante. Por várias razões que não vale a pena tratar aqui, acho que o advento da blogosfera e das redes sociais como fontes de informação e locais de debate tem causado duas tendências contraditórias. A primeira, muito positiva, é de fornecer um constante recurso de fact-checking no debate público. Políticos e jornalistas sabem que, se não fizerem cuidadosamente o seu trabalho, há sempre alguém algures que sabe algo que os primeiros julgavam que ninguém sabia e os segundos não se deram ao trabalho de apurar e estudar devidamente. Mas a segunda, mais perturbante, tem sido a de mergulhar o debate público num mar de opiniões. Hoje, é fácil encontrar todo o tipo de opiniões sobre todos os temas, expressas não apenas pelos cidadãos em geral e pelos políticos, mas também por aqueles - especialistas, responsáveis da administração pública e jornalistas - dos quais esperaríamos mais juízos de facto e menos juízos de valor. Em suma, há uma tendência crescente para tratar os factos como se fossem meras opiniões e as meras opiniões como factos. Assim, acho muito positivo que a primeira iniciativa pública da FFMS não seja a de nos atirar mais opiniões para cima, mas sim a de nos facultar, simplesmente, informação.

Muitos parabéns a Maria João Valente Rosa, responsável pelo projecto.

segunda-feira, fevereiro 22, 2010

Aximage, 10-13 Fev., N=600, Tel.

Três aspectos desta sondagem:

1. Intenção de voto, indicando subida do PSD e descida do PS. Importa dizer, contudo, que as diferenças entre sondagens, tendo em conta as dimensões das amostras, não são estatisticamente significativas.

2. Opiniões sobre PM e "Face Oculta".

3. Preferências sobre melhor líder para o PSD. Entre o eleitorado em geral, PPC 41,9%, PR 37,1% e JPAB 12,2%. Neste caso, a diferença entre PPC e PR é estatisticamente significativa. Depois entre eleitores do PSD: PPC 40,8%, PR 40,7%. Aqui a diferença carece de significância estatística, mas não pelas razões mencionadas no artigo ("Uma diferença que, por se situar dentro da margem de erro da sondagem, revela um empate técnico entre os dois candidatos"). Primeiro, a sub-amostra dos eleitores do PSD é muito menos que a amostra do eleitorado, pelo que a "margem de erro da sondagem" seria sempre mau indicador. Segundo, porque a significância estatística da diferença entre duas proporções não se estima através da margem de erro da sondagem (ver aqui).

segunda-feira, fevereiro 15, 2010

Política comparada

Aqui há uns anos, o Primeiro Ministro da Hungria, Ferenc Gyurcsány, foi apanhado numa gravação a admitir a outros membros do partido que "temos andando a mentir nos últimos dois anos". Seguiram-se motins. Gyurcsány, contudo, aguentou mais três anos no poder, até Março de 2009. Agora vêm eleições. O partido de Gyurcsány, o MSZP, tinha conseguido mais de 40% dos votos nas eleições anteriores, em 2006. Agora, a um mês das eleições, as sondagens dão-lhes 22%. E tendo em conta o sistema eleitoral húngaro, o MSZP arrisca-se a ser praticamente eliminado do parlamento e a dar 2/3 dos assentos ao FIDESZ.

sexta-feira, fevereiro 12, 2010

Mais um de mil exemplos possíveis dos efeitos da linguagem das perguntas nos resultados de uma sondagem


Aqui, via Marginal Revolution.

Eurosondagem, 4-9 Fevereiro, N=1025, tel.

Resultados aqui. A frase que retenho da notícia, e que diz muito sobre como os números nunca são apenas os números numa notícia sobre sondagens: "por caricato que possa parecer, a popularidade dos agentes políticos e judiciais mantém-se este mês intacta", escreve-se.

terça-feira, fevereiro 09, 2010

Alguns gráficos do Trocas de Opinião

Médias móveis das últimas 20 transacções, ponderado o número de títulos transaccionados, desde o início da vigência do contrato até hoje:

1. Paulo Rangel próximo Presidente do PSD? (início a 12-10-2009):


2. Pedro Passos Coelho próximo Presidente do PSD? (início a 12-10-2009):


3. Governo cai antes de Setembro de 2010 (início a 2-10-2009):


4.Défice vai ficar acima dos 8% (início a 17-11-2009):


5. Cavaco Silva recandidata-se à Presidência (início a 2-10-2009):

domingo, fevereiro 07, 2010

Aximage, 2-5 Fev., N=600, Tel.

Detalhes aqui. Apesar da notícia destacar a má avaliação de José Sócrates, aqui não há surpresas. Nesta sondagem, de 0 a 20, a avaliação média do PM é de 8,3. Em Janeiro, era 9,2. Em Dezembro, 10,3. Em Novembro, 11,3. Em Outubro, 12,1. Desde as eleições, Sócrates perde praticamente um ponto por mês. Mais certinho era difícil.

Já nas intenções de voto parece haver ainda menos novidades. Há quem possa achar isto intrigante, tendo em conta a descida do PM. Mas vale a pena lembrar que Manuela Ferreira Leite tem sido ainda pior avaliada do que José Sócrates nas sondagens anteriores da Aximage e que, na sondagem da Marktest (não tenho dados comparáveis da Aximage), é o único caso em que um líder partidário é avaliado de forma predominantemente negativa pelos próprios eleitores do partido.

quinta-feira, fevereiro 04, 2010

Notas sobre alguns resultados da última sondagem Marktest

Há dias falei aqui da última sondagem da Marktest. Olhando para as tabelas de contingência com calma, alguns dados interessantes:

1. 25% dos eleitores do PS classificam a actuação de Cavaco Silva como "negativa". Valor é igual ao de Novembro mas mais alto que em Setembro passado, e o mais alto de sempre.

2. 80% dos eleitores do PS avaliam a actuação de José Sócrates como "positiva"; 80% dos eleitores do PSD avaliam a actuação de José Sócrates como "negativa". Estamos quase tão polarizados como nos Estados Unidos (ver aqui e aqui).

3. 50% dos eleitores do PSD avaliam negativamente a actuação de Manuela Ferreira Leite, contra 35% que a avaliam positivamente.

Naturalmente, a margem de erro associada a estas estimativas é superior à da amostra em geral.

quarta-feira, fevereiro 03, 2010

"Waking up in the poll booth"

No número de Dezembro de 2009 da Perspectives on Politics, que só agora recebi em papel, vem um artigo muito interessante para quem faz e consome sondagens, de Robert E. Goodin e James Mahmud Rice. Goodin e Rice mostram, usando inquéritos em painel - onde o mesmo grupo de pessoas é seguido antes, durante e depois da campanha eleitoral (ou seja, depois das eleições) - que uma parte não irrelevante dos eleitores vota de uma forma diferente daquela que revela em sondagens feitas durante a campanha, e curiosamente, mais semelhantes àquela que manifesta antes da campanha. Isto faz com que, ao contrário do que se poderia pensar, nem sempre é verdade que sondagens feitas mais próximo das eleições sejam melhores preditoras do voto. E sugere que:

"there is indeed something about the poll booth that changes the way people think. When telling an American pollster whether or not they approve of the way the president is handling his job, or even when telling a British or Australian pollster how they would vote if the election were held today, they give an off-the-top-of-their-head response. Voting, however, is serious business. For responsible voters who take their civic duty seriously, it is an occasion to pause and reflect on how good a job the incumbent really has done – not just over the last little while but over the whole period in office."