Pareceu-me muitíssimo acertado o artigo de Rui Ramos hoje no Público (só para assinantes) sobre o livro de Pedro Santana Lopes. A ideia com que se fica no final da leitura do livro é que tudo aquilo que lemos nos jornais é verdadeiro. Quando digo que o que lemos nos jornais é “verdadeiro” não me refiro aos “factos”, mas sim àquilo que a cobertura política nos jornais nos transmite sobre o que significa “fazer política”: ressentimentos, amizades, vinganças, recompensas, empatias, antipatias, produzir e desfazer “impressões” e gerir aparências.
Devido à sua absoluta falta de auto-reflexividade, Santana Lopes parece não se dar conta que, ao mesmo tempo que ensaia uma “denúncia” desta forma de fazer política, o que escreve revela-o como não sabendo fazer outra coisa. E levanta a suspeita que aquilo que o distingue dos seus colegas de profissão, amigos ou inimigos, é simplesmente o facto de não se aperceber do que está a revelar: que para todos eles, como escreve Rui Ramos, o eleitorado não passa de “um mero reflexo de intrigas de bastidores”. Não sei se iria ao ponto de, como Rui Ramos, designar Santana Lopes ou Durão Barroso como representativos desta “camarilha” que é, supostamente, a nossa classe política. Mas se não serão rigorosamente representativos, também não poderão ser casos únicos, nem no seu partido nem nos outros.
Um aspecto que Rui Ramos não menciona é a forma como esta concepção da política é inteiramente cega em relação aos “formalismos” institucionais, ou pelo menos aos que realmente contam (é sensível apenas aqueles que são destituídos de consequências mas fazem parte da “gestão da imagem”). Por exemplo, um dos factos que Santana Lopes relata, e que encara com absoluta naturalidade, é o facto de, ainda enquanto Presidente da Câmara de Lisboa, receber com grande frequência nos Paços do Concelho pessoas que com ele vinham tratar de assuntos de “governo”. Por exemplo, Cardoso e Cunha, em conflito com Fernando Pinto na TAP. Na Câmara Municipal de Lisboa? Mas claro: quem melhor do que o “número dois” do partido, mas também Presidente da Câmara, para fazer chegar as suas preocupações ao Primeiro Ministro, mas também presidente do partido? Tudo normal.
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