segunda-feira, fevereiro 25, 2008

SEDES

Estive fora, e dou-me conta quer um dos temas da semana foi uma "tomada de posição" da SEDES onde se assinala, entre outras coisas, que se tem "acentuado a degradação da confiança dos cidadãos nos representantes partidários, praticamente generalizada a todo o espectro político."

O que dizem os dados disponíveis sobre este assunto? As séries mais longas são dadas pelo Eurobárómetro, que vem colocando as mesmas questões sobre a confiança no parlamento nacional, no governo e nos partidos políticos desde 1997, pedindo aos inquiridos que digam se "tendem a confiar" ou se "tendem a não confiar" em várias instituições. Os gráficos seguintes mostram a evolução em Portugal até Outubro de 2007 da percentagem de inquiridos que diz "tender a confiar", aplicando uma regressão linear simples para detectar tendências:






As indicações mais clara de "degradação da confiança" residem nas atitudes em relação ao Governo. Mas essa "degradação" começa, note-se, em 2002. E analisando os dados ponto a ponto - sempre arriscado, dado o erro aleatório associado a inquéritos usando amostras - atinge o seu ponto mais baixo em 2004, tendo recuperado, ainda que ligeiramente, desde então. Só o mais recente inquérito - final de 2007 - dá sinais de nova descida, mas esses sinais terão de ser confirmados no Eurobarómetro desta Primavera. No que respeita ao Parlamento, as tendências são semelhantes, mais atenuadas, se bem que a última descida seja mais abrupta. E no que respeita aos partidos, a estabilidade é total.

Os dados do European Social Survey têm uma vantagem e uma desvantagem. Por um lado, resultam de inquéritos face a face, realizados com grande rigor do ponto de vista da selecção da amostra, e logo muito mais fiáveis do que o Eurobarómetro. As séries, contudo, são muito mais curtas. Seja como for, os dados são os seguintes. Para cada objecto - Governo, Partidos e "Políticos", a percentagem de inquiridos que se colocam na metade superior de uma escala de 11 pontos - entre 0 e 10 - em que 0 significa que "não têm confiança nenhuma" e 10 que têm "total confiança":

Parlamento
:
2002: 28%
2004: 19%
2006: 21%

Partidos
:
2004: 4%
2006: 7%

Políticos
:
2002: 8%
2004: 4%
2006: 7%

Os valores, especialmente para partidos e políticos, são baixíssimos do ponto de vista comparativo. Mas por outro lado, não se percebe muito bem de que fala a SEDES quando menciona que se "acentuou a degradação da confiança". Qual o ponto de comparação? Se é 2002, a afirmação é porventura correcta. Mas se é 2004, é incorrecta. E se se referem aos resultados do último Eurobarómetro (EB68, Outono de 2007), então deveria ter havido mais cuidado, dado que um único estudo dificilmente autoriza diagnósticos tão categóricos.

Não me entendam mal. Simpatizo com a SEDES e até tenho estima particular por alguns dos signatários da "tomada de posição". Mas da mesma forma como ninguém se atreveria a fazer afirmações sobre a evolução da economia sem olhar para os dados disponíveis, surpreende-me a facilidade com que se fazem afirmações sobre atitudes políticas sem olhar para os dados disponíveis que, felizmente, já vão sendo cada vez mais abundantes.

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