De outro e-mail:
"Sei que deve ser complicado, mas deve haver alguma maneira de se poder medir o grau de Auto-Regressividade que as sondagens pré-eleitorais contêm. Penso que no Porto as Sondagens pré-eleitorais foram decisivas para a Maioria do Rui Rio no Porto, foi factor de mobilização. E penso que as sondagens em Braga , ( duas com resultados largamente favoráveis ao incumbente , outro com resultados em empate técnico) foram factor de desmobilização."
Complicado é pouco. Em 2001 foi apresentado um paper na conferência da World Association of Public Opinion Research, em Roma, intitulado "Towards a Systematic Assessment of the Impact of Polls on Voters: A Meta-analytical Overview and Theoretical Framework" escrito por dois investigadores da Universidade de Zurique (Sibylle Hardmeier e Hubert Roth) onde, com paciência e meticulosidade suíças, se fazia uma "meta-análise" dos efeitos das sondagens no comportamento eleitoral. Proceder a uma "meta-análise", uma metodologia comum nas ciências biomédicas, significa, para abreviar, procurar detectar relações entre fenómenos usando não observações empíricas directas mas sim os resultados de outros estudos publicados. Por outras palavras, uma "super-recensão".
Depois de analisarem 74 estudos publicados em revistas peer-reviewed em todo o mundo, os autores concluíram o seguinte:
1. Nunca se detectaram efeitos significativos e robustos das sondagens na abstenção/participação eleitoral;
2. A maioria dos estudos que detectam efeitos na escolha de voto detectam efeitos bandwagon (sondagens que apontam um vencedor tendem a aumentar a probabilidade de que os eleitore votem nesse vencedor), se bem que também existe um número significativo de estudos que apontam efeitos underdog (favorecendo o "perdedor" nas sondagens);
3. Os resultados são claramente contrastantes consoante a metodologia usada: estudos na área da psicologia social, utilizando desenhos experimentais, tendem a encontrar efeitos bandwagon; estudos usando inquéritos de opinião produzem resultados mais variados.
Em resumo, os autores concluem que as sondagens produzem quase certamente efeitos, mas não é evidente em quem, como, em que direcção e em que circunstâncias. Certo certo é que, em resposta à sugestão do leitor, nunca se encontraram efeitos das sondagens na mobilização ou desmobilização eleitoral, mas apenas na intenção ou escolha de voto, e mesmo assim em direcções contraditórias. Isto quer dizer que não existem? Não. Quer dizer que estamos à espera que alguém prove que eles existem. E não é por falta de tentativas...
O problema é este: como saber se as expectativas que as pessoas formam sobre os resultados das eleições resultam directamente das sondagens em si mesmas ou de outra coisa qualquer? A verdade é que, quando questionados, antes das eleições, sobre o que esperam que venham a ser os resultados, os indivíduos que estiveram expostos a sondagens tendem a dar palpites muito aproximados aos daqueles que não estiveram expostos a elas. E se estar "exposto" directamente é apenas uma pequena parte dos efeitos gerais que as sondagens podem ter nas expectativas dos eleitores (porque podem condicionar indirectamente essas expectativas ao afectaram a cobertura mediática e o discurso político), como se demonstram esses efeitos indirectos? E se há sondagens contraditórias num mesmo momento, quais delas têm efeitos em quem, e como? Complicado, deveras.
O leitor relata ainda um episódio interessante destas eleições (mais um):
Chamo a sua atenção para o que se passou em Braga. No dia seguinte à publicação de uma sondagem em que se dava conta de um empate técnico num jornal diário, num outro, fortemente identificado com o poder local, dava-se uma sondagem com diferença de 17 % entre os dois maiores candidatos (ver http://www.marktest.com/wap/a/p/conc~Braga/id~cd.aspx) No entanto esta sondagem, a última a ser apresentada , foi realizada duas semanas antes da outra, e três semanas antes da sua publicação! É errado pressupor que houve manipulação do timing da sondagem? É normal congelarem sondagens durante 3 semanas?
"Pressupor" parece-me errado, mas normal não será, concerteza.
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